Isolina Corrêa da Silva

O material deste post diz respeito a Dona Isolina Corrêa da Silva, abandonada na Roda dos Expostos da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre em 2 de fevereiro de 1877. Antes porém, vamos a uma breve descrição do que e como se dava esse mecanismo da Roda.

“… A roda dos expostos ou roda dos enjeitados consistia num mecanismo utilizado para abandonar (expor na linguagem da época) recém-nascidos que ficavam ao cuidado de instituições de caridade. O mecanismo, em forma de tambor ou portinhola giratória, embutido numa parede, era construído de tal forma que aquele que expunha a criança não era visto por aquele que a recebia.
Esse modelo de acolhimento ganhou inúmeros adeptos por toda a Europa, principalmente a católica, a partir do século XVI.
Em Portugal, as rodas espalharam-se a partir de 1498 com o surgimento das irmandades da Misericórdia, financiadas pelas Câmaras municipais.
A Santa Casa de Lisboa foi pioneira neste dispositivo.
Segundo as Ordenações Manuelinas de 1521 e confirmadas pelas Filipinas de 1603, as Câmaras Municipais deveriam arcar com o custo de criação do enjeitado nascido sob a sua jurisdição, caso esta não tivesse a Casa dos Expostos e nem a Roda dos Expostos. A Câmara teria essa obrigação até que o exposto completasse sete anos de idade.
As primeiras Santas Casas de Misericórdias da América Portuguesa que receberem a Roda dos Expostos foram as de Salvador (1726) e a do Rio de Janeiro (1738).
..” Texto extraído do Blog do Facó.

Fazendo uma visita ao acervo da Santa Casa de Misericórdia em 2017, solicitei se possível ver os documentos que falavam da entrada e saída das crianças enjeitadas na instituição, pois sempre ouvi no circulo familiar que a mãe de uma das minhas bisavós tinha sido retirada da Roda da Santa Casa. A pesquisa rendeu resultado, gerando inclusive uma pequena confusão no começo, pois ao invés de achar uma menina Isolina, achei duas que foram encaminhadas para a região de onde minha família originalmente era habitante. De volta as perguntas dentro do circulo familiar, foi possível identificar quem era a pessoa que eu procurava.

Ficha Cadastral da Casa dos Expostos – Santa Casa de Misericórdia – Porto Alegre – RS
Registro de Acolhimento – Isolina Correa da Silva – Santa Casa de Misericórdia – Porto Alegre – RS

A qualidade da foto não ficou boa, a grafia de 1877 também não colabora, logo foi necessário transcrever o texto com a ajuda do pessoal do Museu da Santa Casa, ficando então como apresentado abaixo:

Nº: 1762, 2 de Fevereiro de 1877
Izulina (Isolina)

As 11 horas da noite lançaram na Roda uma menina de cor branca, recém nascida, trazia a seguinte roupa: camisa de morin com cabeção bordado, um corpinho de pelúcia com um cinto de chita cor de pinhão, um coeiro de trouxinha usado, um pedaço de chita roxa servindo de fraldão, um pedaço de baeta encarnada muito velha, servindo de mantilha, uma toalha lisa de morin nova e um barretinho de meião.
Batizada em 10 do corrente, com o nome de Izulina (Isolina). Foram padrinhos Luiz Antônio Corrêa e sua filha Luiza da Luz Corrêa. Dada a criar no mesmo dia a Dona Generosa Maria da Silva Nunes, residente em Canta Galo, distrito de Belém. Protocolo nº230322-000505

Confesso que ao encontrar, ler e traduzir o que estava ali naquela folha antiga, pensei quanto tempo essa história esteve ali guardada em meio a tantas outras histórias muito semelhantes, por muitos anos, ouvi sempre a história de que ela veio da Roda e isso começava e terminava assim, era veio da roda, ponto… Buscar este texto, tentar saber um pouco mais sobre o que de fato ocorreu era algo que me motivava a não desistir de encontrar, por mais folhas que tenha vasculhado até enfim encontrar.

Dona Isolina Correa da Silva, com suas netas por volta da metade do Séc. XX, na Zona Sul de Porto Alegre.

O final do registro informa que a menina Isolina Corrêa da Silva recebeu no batismo o sobrenome dos padrinhos que estavam presentes na Missa da Santa Casa, logo após ela foi dada aos cuidados de Dona Generosa, que pelo resto da vida foi sua mãe, recebendo para isso a ajuda de custo que a lei garantia as “criadeiras”, como eram chamadas as famílias que retiravam as crianças da entidade para cuida-las em casa.

Dona Isolina, ou “Manha Velha” como era chamada pelos netos, casou com Francisco Martins da Rocha, conhecido como Chico Serrano, nasceu em 4 de maio de 1873, filho de Manoel Martins da Rocha e Francisca Cândida da Silveira, foi batizado em 7 de janeiro de 1874, na Igreja Nossa Senhora de Belém, no distrito de Belém Novo, extremo sul de Porto Alegre. Da união de Isolina e Francisco nasceram 3 filhas:

Maria Izabel (1894) cc Manoel Marcelino Pires da Rosa, tiveram 12 filhos: Francisca “Chica”, Hermógenes, Manoel “Maneca”, Dulce, Manoela (minha avó paterna), Izolina, Osvaldo, Agostinha, Maria Terezinha “Tereza”, Adão, Alvino e Admar “Marinho”

Agustinha (1897) cc João Ignácio da Silveira, tiveram 1 filho: Armando

Manoela (1899) cc Adolpho Cardoso da Costa, tiveram 1 filho: Agostinho

Dona Isolina viveu até seus 91 anos de idade, quando veio a falecer em 28 de maio de 1968, sendo sepultada no Cemitério de Belém Novo no jazigo da família. Esta então é a sinopse de uma entre tantas crianças que um dia foram deixadas na Roda dos Expostos, quando eu estava pesquisando estes documentos, reparei na quantidade enorme de crianças que logo após serem recolhidas, vinham a óbito, felizmente, Dona Isolina seguiu o curso da vida, gerou vida e permanece viva nas memórias e reminiscências de quem a conheceu e contou sua história, para os filhos, netos, bisnetos…

Publicado por

sumulastche

Brasileiro, casado, nascido em Viamão (RS) no dia 25/12/1976. Pesquisador de futebol desde os 11 anos de idade, membro da RSSSF Brasil (www.rsssfbrasil.com), desde 2000. Procuro dados sobre o futebol brasileiro, com a pretensão de levar a todos que visitem este blog, um pouco de história sobre nossos clubes, atletas e campeonatos.

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